terça-feira, 22 de agosto de 2023

AMANHECER AGOSTO

Floresce verde musgo
por entre pedras 
nascidas ao acaso.

A luz orvalha cor
no silêncio sereno
do céu encarnado. 

Naquela manhã,
singular e tão igual, 
será em breve tarde. 

sábado, 10 de novembro de 2018

NAQUELA PRIMEIRA NOITE DE VÁRIOS DIAS


Teneo quia teneor
Na primeira noite
De vários dias
Havia, quem sabe, nada;
Quem sabe um sabre
A estilhaçar a alma
Em um grito soco
Mudo e escuro de anos.
Não havia sequer lua,
Nem vésper a despertar
Nem sombra de lampejo,
De quem sabe a esperança
Em alguma vitrine da memória.
Não. Nada.
Lá fora, somente o princípio
Surdo do medo; atônito.
O mundo em marcha
Para o futuro, pretérito
Perfeito das eras;
Uma taça de vinho sangue
Tragada de torturas.
Naquela noite
Havia algo oco
Um espaço de espadas,
Cacos cortantes
De porões e poeira,
Tumbas, tumbeiros,
Fossos, farsas,
Força, farda,
Faca, forca;
Livros em chamas
Que ardiam em primavera
À noite sem flor
Aberta em suástica.
Naquela noite havia somente
A perplexidade escura;
A fé cega no mito ariano,
E um império de vendilhões
Em legião de seguidores
Que se enredavam
Diante do advento
Dos velhos dias
Capitaneada pelo ódio,
Semeado ao tempo
Que se iniciava
Naquela primeira noite
Do resto daqueles anos.

09 e 10 de novembro de 2018

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

HABACUC

Ainda que a flor
feneça
e  a semente
não prometa frutos,
ainda que a vinha
amargue pragas
e os campos
se cubram de gafanhotos,
ainda que a vida
se finde, inesperada,
e as lágrimas
faltem aos olhos;
(...)

Ainda assim,
Habacuc,
valeu a jornada,
o caminho e a caminhada,
assim como a certeza
de que só Tu,
meu Deus,
somente Tu,
Senhor,
me basta ! 

sábado, 1 de fevereiro de 2014

ZEN PENSAMENTO

Bolhinhas de sabão,
uma após outra,
suspensas no vento.

Esféricas, tão etéricas;
leves e simétricas,
em turbilhão de cores.

Flutuam... logo explodem
ao sol do verão;
fugaz mo(vi)mento.

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

TRANSFIGURAÇÃO

Na rosa vermelha,
teu sangue encarnado.
Em cada árvore,
tua cruz pregada.
Em todo vento,
teu verbo anunciado.
Sobre toda água,
o teu Espírito paira.

No vinho partilhado,
as primícias de teu Reino.
Em cada pedaço de pão,
teu Amor que nos devora.
Em todo horizonte,
a Parusia (cada vez) mais próxima.
Sob o céu estrelado,
o advento da Criança.

(...)

Nas manhãs de verão,
o maná da tua luz.
Em cada noite escura,
a tua Fé nos acompanha.
Em todo dia da semana,
um domingo de Páscoa.
Sobre o morro, a favela:
Tu, Senhor, Moisés e Elias.

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014












A luz, a floresta, o caminho...

NO TEMPO EM QUE SONHÁVAMOS

No tempo em que sonhávamos,
nós éramos despertos...
Vestíamos a noite insone
com a luz das auroras,
dos jasmins e mariposas;
povoada de sussurros.

Nós tínhamos raízes,
robustas e fortes,
cobrindo todo o espaço;
qual nuvem de pássaros
ou cardumes de folhas.

Andávamos com as árvores
e tecíamos as chuvas
com o delicado sereno
das madrugadas desertas;
habitadas de crepúsculos.

Nós sabíamos do fogo,
sua vida obscura,
e amávamos suas brasas
espalhadas pela terra;
centelhas de raios voando
ao sopro de vaga-lumes.

Deitávamos, solenes, as pedras
no leito dos rios e fontes
como quem semeia a lua
sobre o sangue da fêmea;
ou ao mar recolhe a lágrima
do doce olhar das crianças.

No tempo em que sonhávamos,
nós éramos despertos
e as palavras dormiam
na carne de nossas almas...
e o Espírito brincava (todo dia),
dançava na Sua presença
e se alegrava com os homens.


segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

QUANDO UM DIA EU MERGULHAR NO GRANDE MISTÉRIO...

Quando um dia eu mergulhar no grande mistério
serei com os oceanos, os peixes e as vagas;
serei com as nuvens, a garoa e a brisa;
serei com as florestas, montes e vales;
serei com a chama, as fogueiras e suas brasas;
serei com os pássaros, as abelhas e as raposas;
serei com os lagos, rios e cachoeiras;
serei com as gaivotas, o salmão e os gatos;
serei (...)

Quando então eu mergulhar no grande mistério
verei por fim que desde o início
estou nele mergulhado;
e nele estava,
e tinha parte com ele
a todo momento...
desde o dia em que nasci
para os claros ocultos que há
em toda manhã,
nos sempre dos crepúsculos,
nas noites sem luar,
nas estrelas (agora) decrépitas.

Quando um dia eu mergulhar no grande mistério
saberei (finalmente)
que jamais me havia dele apartado
e era com ele que estava
e nele estou desde sempre.
E que todo o resto (digo, a existência)
é intervalo, reticência... vagas,
(gaivotas, gatos, colinas, mariposas,
o luar e estrelas, fontes e vales,
visgueiros e brisas, o fogo e a noite...)
o tudo e o nada;
quando um dia eu mergulhar no grande mistério.



05 de janeiro de 2014
Domingo da Epifania de Nosso Senhor Jesus Cristo

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

NATIVIDADE DO AMOR

(ou “De como o Amor amou o corpo e nele fez-se natividade”)


No altar do tempo,
um templo vazio.
A infinita Chama
(quase finita), clama!
Sobre o altar
o corpo esquartejado
jaz privado do Vento;
pois no templo, Mani-
queu, sacerdote feito,
maníaco baniu a brisa:
cerrou as portas,
fechou as janelas,
criou cadeados e trancas.
(tinha medo que o Vento
apagasse a Chama)
Sem a mínima brisa,
a chama ficou sufocada.
A treva instalada
carcomeu as entranhas...
terra desolada, sem esperança!
  
Chega então a Criança!

Pergunta pelo corpo, curiosa!
Vê de um lado a carne,
de outra a alma;
de um lado a matéria,
de outro a metafísica;
de um lado a treva,
de outro a claridade...
Até mesmo o Amor
estava separado:
de um lado o prazer,
de outro a caridade...
um cabeça em um canto,
um coração no outro!
Um coração pulsando morto...
o destroçado corpo dos santos
sobre o profanado altar do sagrado!

Mas, com a Criança chega o milagre!

O Vendaval abre
as trancas do templo,
varrendo o pó do sudário
linho do altar.
O Hálito lambe
as páginas do Livro.
A pia batismal
tem suas águas a vibrar.
O Povo de Deus
arrebatado para dentro...
e o corpo assim
ganha Corpo
sentindo-se engraçado
com as cócegas do Vento.
O mesmo Vento
que faz dançar
a chama do Círio...
a bailar às voltas
com o Vento.
(cheia de seus entusiasmos)

A Criança é o milagre! 

Nela, o sagrado em carne
ganha corpo.
Nela a vida está anunciada;
desiderata: pela estrela.
Com seu nascimento
a ressurreição fez-se advento;
pois a carne em verbo
fez-se sangue, pele, pelos, corpo,
povo, pão, vinho, templo.
O sagrado ofício das horas (o tempo)
na liturgia do dia a dia:
a grande alegria da vida
perante as pequenas (e grandes)
mortes cotidianas.

A criança, divina porque humana,
suga prazerosa o peito de sua mãe
tão terna: sua terra;
seu Reino, nossa esperança!

segunda-feira, 19 de agosto de 2013


















Dai Koo Myo

DAI KOO MYO

(Variações em torno dos três kanjis)



I

Grande Luz que brilha.

II

Grande (o homem que se abre)
é o brilho (fogo que percorre)
que muda os dias (em eternidade)

III

Grande aquele que se abre
ao brilho da Luz eterna
que rebrilha no passar dos dias.

IV

Grande Luz,
fogo que percorre,
com seu brilho
o passar dos dias;
eternamente.

V

Grande é o brilho
da Luz - fogo que percorre -
que rebrilha e transmuta
o prosaico passar dos dias;
as estações e anos.

VI

Grande Luz
fogo que percorre
com seu brilho
transmutando
os dias e anos.

VII

Grande é aquele
que acolhe a luz
do fogo que percorre
os dias e os anos
transmutando seu espírito.

VIII

Grande é aquele
que acolhe
o brilho da Luz
a qual percorre
e rebrilha em sua vida.

quarta-feira, 6 de março de 2013

O Caminho, os pés e o Horizonte; itinerários.

ITINERANTES PALAVRAS

I

Escuro ainda
alva luz en-canta-se;
anúncio da partida.

O livro das horas,
cajado e uma túnica;
acompanham-me agora.

Ilumina-se a estrada
aos pés do horizonte;
aurora que se aflora.


II

Repouso meus olhos
ao largo horizonte,
enxutos pela brisa.

Despertam a relva,
os pés e o sereno
que cobrem a poeira.

A estrada convida-me.
O sol a percorre
de silêncios e luz.


III

Nuvem ao horizonte.
Sereno orvalho nos seixos
ao som distante dos galos.

Os passos sem pressa
ditam o ritmo da jornada
no livro de viagem, comigo.

Ao longe, a nuvem segue;
não mais sozinho, eu
e o caminho solitário.

sábado, 5 de janeiro de 2013

Mar, gaivotas, golfinhos...

DAS ESTAÇÕES DOS ANOS

Do mar nos vem o vento
que leva consigo
as lágrimas de chuva;
e varre as nuvens (para longe),
pesadas e escuras,
e prenuncia a primavera.
O verão, intenso e feérico,
nos deixa sereno,
em sua epifania;
o inverno tardará (agora).
No outono,
as folhas dispersas
no caminho
estão ofertas
entre gaivotas e golfinhos.

Das estações, um só tempo;
primícias e semeaduras.

No sempre, a mudança:
marés e moinhos.

O perene em um instante,
fugaz e tão (e)terno;
a certeza do sempre
e mesmo caminho.

sábado, 13 de outubro de 2012

UM CANTO NOVO (O Hino)

Dos quatro cantos
eleva-se um hino
tão novo e tão antigo
quanto as pedras.

Seus acordes são fiados
dos sonhos tecidos
por gerações de despertos
que habitam a Graça.

Suas notas silenciosas
espalham pelos ares
a lâmina das águas,
a luz dos lagos...

os tambores da terra,
a cítara dos mares;
a demarcar com mil tons
que Alto orquestra-se:

o hino, tão novo de tão antigo,
silente de tão estrondoso:
Aurora que se estrela
ao crepúsculo do inimigo.

sábado, 22 de setembro de 2012


Ilha, brumas, sonhos... en-cantos.

HY BRASIL


Ao vasto oceano
estende-se vagas
ondas de terra.

Derruídas eras
onde perene deita
o ditar da brisa.

É nela onde o silêncio
ecoa solar no viço
das florestas antigas

e onde vento repousa
à flor das águas
o sentido dos ciclos,

onde afloram os veios
dos rios do paraíso
- as veias da terra - 

que perenes regam
o crepúsculo dos inícios
e o vasto mar dos dias.

Ao largo horizonte
estende-se em testemunho
arquipélagos de sonhos...

submersos de memórias:
Ancestrais gaivotas
despertam golfinhos futuros.




domingo, 2 de outubro de 2011


O Caminho das Águas...

KAIRÓS

"Acaso alguém espera o que vê?" (Rm 8, 24)

Na deserta e fria noite,
dominada pela tempestade ruidosa,
entre arruinadas florestas tomadas
pelos escombros das sombras e do medo;
nada se anuncia, o inverno verga
a pálida paisagem cinza dos anos.

(...)

Invisível porém aos olhos, no útero do tempo,
a semente a-guarda oportuno instante.
No silêncio quente e úmido das brumas
a dádiva gesta-se à flor da terra:
serenas águas fecundam os mares,
o vento afaga ancestrais florestas,
fogueiras seguem iluminando os passos
dos que perseveraram na noite escura...

Nenhuma sombra mais assombra,
nem mesmo bruma agora oculta;
arvora-se a vida, ávida encanta-se solar
a perene primavera: a Graça Divina.

segunda-feira, 29 de agosto de 2011


Saint Brendan... and Hy Braesil.

A BARCA

Tende confiança! Sou eu...” (Mt 14, 27)

Enquanto Ele orava,
nós atravessávamos o mar
em nossa frágil barca.
E era adverso o vento;
contrárias e agitadas as vagas
que enfrentávamos.
Dentro do barco, o medo
nos fazia companhia
e o caos nos balançava...
na noite que avançava
a escuridão tomava acento
naquela noturna viagem.

Sim, o frio e os temores,
nos assaltavam de tremores...
quando Ele descendo do monte
caminhava em nossa direção
sobre aquelas águas.
Sim, em nossa direção,
o Senhor dos Elementos
seguia diante da treva
e o abismo das águas...
a dizer aos que duvidavam
do que viam:

‘Coragem, sou eu...’

Então, um dos nossos
foi ter com Ele, que mareando
seguia o impetuoso rochedo:

‘Vem!’

Nosso irmão, que agora
também caminhava
e ao Seu encontro tomava pé,
superava o medo
(o mesmo medo que
antes nos tomava...).
Mas, o vento contrário
e as ondas incertas
logo escureceram sua alma,
soprando nela temores...
e dentro dele, ele disse:

‘Senhor, salva-me!’

Tomado de compaixão,
diante daquela frágil barca,
o Senhor dos Elementos,
do Mar e do Vento,
disse à pedra que afundava:

‘Fraco de fé, por que duvidas?’

E então o tomou em suas mãos...
e caminhou ainda pelo mar;
e o vento parou, e as ondas
eram agora serenas a embalar
o frágil barco que atravessava
aquele noturno mar...

sexta-feira, 10 de junho de 2011

ORAÇÃO AO VENTO

Ao Alento de Deus, hálito
que alimenta
a fornalha do peito,
onde arde e movimenta
o sopro das palavras
Divinas,
eu lanço ao tempo
uma breve prece
ao misericordioso Deus:

Que a brisa sopre
e enxugue tuas lágrimas,
que o vento varra
a poeira das estradas,
que a ventania desfaça
a névoa de teus olhos.

E que a tempestade
ao chegar, logo passe,
e somente desfaça
o penteado das jovens.
E que a bruma abra
apenas ao mistério
que a envolve,
em sereno orvalho.
E que seja aragem
aquilo que nos comove,
a espantar da alma
a cinza e a morte.

Amém.

segunda-feira, 16 de maio de 2011


Invicto o Sol, triunfa sobre a escuridão..

CANTO AO VENTO

(Para harpa e sopro)

INTRÓITO (A Paisagem)
Arruinados prados,
soturno céu,
cinza.
A lua eclipsada
marca sua face
mais escura...
Nenhuma estrela dita
seu brilho, nem sombra,
de nuvem espalha (aqui)
alguma mínima brisa...
Ao sul, nuvens secas
carregadas de agonia;
ao este uma cega luz
escurece a visão;
ao norte, o desespero
forma-se denso...
enquanto
ao leste nasce
as dores do parto.

O CANTO (Do Mestre de Canto)
Então do meu peito
fez-se pranto...
e dentro do ar pesado
alçou o leve canto:
(com se fosse
a voz de muitos,
minha voz
encantou-se...
como gerações de ondas
a murmurar memórias;
como florestas
a farfalhar primaveras;
como vento
a varrer as folhas mortas...).

O CORO
Escuta, Tempo Novo,
a velha farsa:
eis o desespero,
a agonia
e o medo...
o seu velho silêncio
calado
das mordaças
dos cativeiros
a prender com
suas falas
a névoa-nada,
o oco eco,
o vago vazio
do seu não sentido.
Escuta, Tempo Novo,
O desespero,
mau conselheiro,
capaz de secar nuvens
e esfriar fértil vale;
eis a agonia
do velho tempo
a rebrilhar escura
sua luz negada;
eis o medo,
o inimigo calado,
a tecer ciladas.
Eis a tríplice
farsa:
a aliança
do desespero,
da agonia
e do medo
juntos à morte (em vida)
contra o novo
já vivente:
o tempo re-
nascido no perene
a fiar no presente
seu amor e-terno.
Escuta, Tempo Novo,
a agonia dos que
com-fiam na morte;
pois ela não pode
gestar uma vida,
nem da noite
fazer um dia,
nem da escuridão
uma alvorada.
Pois a vida
já foi pregada
e triunfou invicta
no Domingo de Páscoa.
Aleluia !
(pausa)
Escuta
o oportuno momento
de tecer o encontro
entre o canto e a harpa,
o tambor e a flauta,
a cítara e a gaita...
pois das cores do arrebol
já nos nasceu a alba
e da semente esperada
a primavera surgida...
Pois mesmos das ruínas,
as lágrimas são capazes
de reviver o seco vale
já que a terra não esquece
na semente oculta
a porta aberta ao broto.

O CANTO (Do Mestre de Canto)
Então do céu,
uma lágrima correu
e a brisa se converteu
em azul.
E o céu lilás alvoreceu
cobrindo de cores vivas
todas as partes do mundo:
e a esperança soprou
mais forte ao sul,
e o este resplandeceu
fulgurante clarão
e o norte re-viveu
em uníssono canto
enquanto
o leste amanhece
sempiterno e tão igual
a aurora do amanhã.

sábado, 19 de março de 2011


Taliesin, o bardo.

MISTÉRICA ARTE

Sob uma antiga árvore
à beira do caminho
percorro a quietude
de tudo e corro ao encontro
desse outro que há
em cada canto do mundo:
no mais pequeno, no miúdo,
no efêmero, no diminuto;
assim como também
no mais extenso, no vasto,
no sublime e no imenso.

Eu apanho em cada flor
aquela gota de orvalho
que falta em toda estrela;
e contemplo em um voo
azul de borboletas
algo das vagas do mar distante.
Eu leio em cada concha
a memória das montanhas
e dos naufrágios humanos;
e percebo no luzir
das noites estreladas
o revoar dos vaga-lumes.
Eu cheiro no perfume dos jasmins,
destilados ao luar,
a evocação do invisível;
e no visível de uma canção,
a solar de uma flauta doce,
os acordes de um sonho.

E em tudo, eu re-colho e desentranho
aquela palavra impronunciada
e com ela destilo o verso urgente;
ofertando aos olhos gentis,
dos diversos leitores,
a esperança explícita de beleza
da explícita poesia
oculta em tudo...
Eu sinto em cada
parte de todo mundo
um canto uníssono
de um mesmo canto:
novo de tão perene,
antigo de tão único.
Amanhecer...

FAZ ESCURO, MAS EU CANTO...

Faz escuro, mas eu canto
Porque a manhã vai chegar.
Vem ver comigo companheiro,
(vai ser lindo) ouvir o povo cantar. (bis)
Vale a pena não dormir para esperar
a cor do mundo mudar. (bis)

Thiago de Mello


Diante da noite escura,
eu escuto teus passos
que se apressam em anunciar
a chegada do dia.

Eu escuto, dentro do silêncio,
teus passos seguros e firmes,
como a rubra barra do sol
a romper no horizonte.

Eu escuto teu canto sereno,
mas firme e confiante,
como os pássaros despertando
do longo sono da noite.

Eu escuto teus passos...
dentro da espera paciente;
do Amante a velar no escuro
a Amada que vem, clareando.

Eu sigo, adiante, o anúncio
da manhã que se gesta...
ao vagar das ondas e-ternas
afagando o dia; em cantos.

sábado, 12 de março de 2011

AS CRÔNICAS DE ARSGOTT – Canto 7

O Ancião contempla a fogueira, agora, quase extinta... Vê-se em sua face, uma lágrima; quem sabe pelos irmãos que se perderam no caminho. Por aqueles que tombaram vivos, entre os mortos. Ele olha a fogueira que transmuta a matéria... e abre-se em canto: 

Sobre a falésia, diante
do mar revolto em ondas,
castigado pela fúria das Eras,
o círculo do perene – o antigo
e o novo – fita o ocidental
horizonte anunciar-se escuro.

O olhar daqueles que olham
a nuvem escura que avança
é impassível e penetrante;
raios de luz, cantos e trovões,
ditam o sentido do conflito...

Aqui, os poucos restantes,
os que foram fiéis ao Espírito,
conformam-se em escudos e lanças,
lançando ao Alto a Palavra que salva:
o Impronunciável Nome...

Então as águas despertam
como fonte em terra seca...
e das pedras escuta-se o grito
das árvores que se contorcem...
e as nuvens escuras param,
resplendecendo no horizonte o Fogo.

Os anjos se movem sobre
as águas do abismo, novamente,
e tecem a Porta.
A coluna que em luz converte-se,
anuncia a Nova Aurora:
o crepúsculo do dias, a Volta
ao início, a primavera sempre...

Os que fitam o Oeste,
em Oriente convertido,
voltam-se ao Sul,
o novo Norte:
uma nova estrela re-brilha
no horizonte humano
de tão divino...
restando o en-canto vivo, dos antigos
e dos novos, o (e)terno sonho.


Depois de entoar este canto, Taliesin partiu em direção à floresta que fica à beira mar. Ele partiu... deixando no ar um perfume antigo, mas também novo. E ainda hoje suas palavras são escutadas na brisa, no murmúrio das fontes, no tilintar das pedras ao sol, no bruxuleio das fogueiras no meio do ano... Ele re-nasce em cada manhã, conosco... e quando a noite chegar, novamente, ele irá cantar pra nós o perene Canto Novo.

domingo, 23 de janeiro de 2011


Depois da tempestade... o arco-íris.

DEPOIS DA TEMPESTADE

“Fica o drama dos que esperam na falésia
Por quem Deus já destinou à eternidade
E é lição que contra Deus não há vontade
Fica a fúria calma da grande saudade."


(Madredeus - A Tempestade)

Entre o secular
descaso dos poderes
mundanos,
e a exploração da dor
e do desespero
humano;
a revolta se faz meio
aonde voam vis em volta,
a semear tempestades.

Silêncio !
Com coração
contrito e hálito sereno
elevemos a Deus
nossas preces; miseri-
cordia com-paixão
tenha por nós,
e revele a nós
o justo a fazer:

Que o Vento Leste
sopre o cinza das nuvens
e a brisa varra
as lágrimas da face.
Que as águas lavem,
oportunamente,
do vale a lama
que o cobre...
e a espada seja
clara e certa
a separar Luz e treva.
E novamente restitua
as céus, um Aleluia.

Pois sábio é fitar
no hoje, o horizonte
(para além da lama,
as ruínas e o desânimo):
há um Sol, sempre,
a brilhar por sobre
as nuvens escuras do agora...

Resta-nos anunciá-lo:
Vida entre os vivos;
Vivo, apesar dos mortos.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011


Os Magos: vitral de Chartres.

EPIPHANIA

Por sobre o ruído
das multidões anônimas
das cidades cotidianas,
e o silêncio
arruinado pela angústia
da noite escura...
eu escuto teus passos
que se apressam
em anunciar a chegada
do dia !

Lá, na periferia do mundo,
entre os esquecidos
e os rejeitados...
Lá, em um canto qualquer
de um banco de praça...
Lá onde ninguém
sensato espera...
nos chega a Primavera
à criação inteira,
que entre dores,
geme e sofre,
sorri e canta;
em expectativa
o crístico parto.

Enquanto o sistema
traça seus laços...
uma Criança se aninha
no útero da Terra;
e bendizendo a vida,
ao nascer
mata a morte.

Ela nasce siderada
pela esperança
dos que amam,
pela fé daqueles
que fitam
o justo horizonte...
pelo amor
dos que sonham
com-paixão:
um Reino sem reis
aonde impera
a comunhão
e lei, assinada no coração,
dita a alegria da Graça.

Em um canto qualquer...
a flor anuncia-se
nos campos da Terra,
e rompendo o asfalto
(frio e falso do tempo)
abre-se à eternidade
do definitivo instante:
Ei-la, a Criança;
divina porque humana,
a cantar o re-novo canto:
‘o Reino de Deus está
no meio de nós...’

quarta-feira, 10 de novembro de 2010



"paisagem ubiqua", 2010
Luciana Ohira, Luis Costa e Sergio Bonilha
projeção de vídeo meta-anaglífico, filtros de cor (Red e Blue) e altofalantes.
http://www.youtube.com/watch?v=V0bihrF0o8U

terça-feira, 9 de novembro de 2010

ETÉREA PAISAGEM

Ao bardo Dylan Thomas...

Em praias azul cobalto,
sob altas falésias solares,
um mar cor de fogo banha
o continente verde esmeralda.

Uma borboleta escarlate
deixa na brisa suas pegadas:
traços de luz, caligrafados passos,
de brilho lunar e cintilantes estrelas.

No horizonte violeta, acor-
de pérola semeia cardumes
de ígneo mar, rubras vagas,
que povoam o céu estanho.

Ao largo... a planície esmeralda
abriga moradas diáfanas aonde
colunas alvas guardam os caminhos,
os portais, o mar e o horizonte.

VIVIANE

Para Vivi, nos oito anos de nosso mágico encontro...

No lago dos teus olhos,
Viviane, mora uma fada lilás:
vívida de tanto (a)mar
e en-cantos do fogo.
O que chamas lágrima,
labareda de emoções,
é maternal sinal
de tua humana condição:
mulher, mãe, amante.

Dama que no lago
da vida revela oculta
o brilho de sua espada,
o cálice de sua flama,
que toca minha harpa:
a melodia anunciada
por entre os teus
golfinhos sonhos.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

CANÇÃO DE TALIESIN

“Pessoas são paisagens...”
(Sabedoria Arcana)


“Não a nós, Senhor, não a nós, mas ao teu Nome dá glória, por amor de tua benignidade e da tua verdade.”
(Salmo 115. 1)


Sob uma velha árvore, depois de caminhar léguas, o Ancião contempla um fio de sol romper as brumas... e descortinar a paisagem da Ilha Encantada, a Casa da Floresta e a Capela; então ele canta:
Eu sou um mar
aonde deságua
as veias da terra;
um campo em flor
que a brisa
recolhe perfumes;
eu sou a chama
de uma vela
que teima em
espantar a escuridão
da noite sem lua.
Eu sou uma árvore
que abriga
animais fecundos;
sou uma cachoeira
que desperta
os sonhos das pedras;
uma fogueira
que revela
os segredos da madeira;
eu sou uma nuvem
que passa e se con-
forma em várias
formas e... chove.

(...)

Eu sou várias
coisas, mas El( )
que oculto se revela,
dentro e por meio
de tudo e em tudo,
em mim, é o que importa...
Por isso, não a mim,
Senhor, dá glória;
mas a harpa
que em mim canta:
desentranhando das coisas
o que é importante;
a Luz que ilumina,
e não a que cega.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Céu azul, sol vento....

CÉU AZUL, CLARO VENTO

O verão
ainda em flor,
aberto em voo,
o céu azul
testemunha o alto:
em tua carne
a luz reparte-se
e a celeste cor
nos oferta;
tu abres aos pés
dos itinerantes
o vivo caminho
que nos ilumina.

Tu, céu azul,
todo dia nos inspira:
mesmo que a tempestade
tome e revolte as águas
e as nuvens tornem
tudo nublado e cinza...
nós sabemos
que estás lá, acima;
pois habitas o Alto
impassível:
límpido, sereno, claro...
belo, gracioso e sublime,
como os anjos.

terça-feira, 14 de setembro de 2010


O Nascimento... by Ribeiro Halves

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